Publicado
no informativo nº 623 do STJ.
De
início, pontua-se que considerar que a embriaguez ao volante, de per si, já
configuraria a existência de dolo eventual equivale admitir que todo e qualquer
indivíduo que venha a conduzir veículo automotor em via pública com a
capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool responderá por
homicídio doloso, ao causar, por violação a regra de trânsito, a morte de alguém.
Não se
descura que a embriaguez ao volante é circunstância negativa que deve
contribuir para a análise do elemento anímico que move o agente. Todavia, não é
a melhor solução estabelecer-se, como premissa aplicável a qualquer caso
relativo a delito viário, no qual o condutor esteja sob efeito de bebida
alcóolica, que a presença do dolo eventual é o elemento subjetivo ínsito ao
comportamento, a ponto de determinar que o agente seja submetido a Júri Popular
mesmo que não se indiquem quaisquer outras circunstâncias que confiram lastro à
ilação de que o acusado anuiu ao resultado lesivo.
O
estabelecimento de modelos extraídos da praxis que se mostrem rígidos e
impliquem maior certeza da adequação típica por simples subsunção, a despeito
da facilidade que ocasionam no exame dos casos cotidianos, podem suscitar
desapego do magistrado aos fatos sobre os quais recairá a imputação delituosa,
afastando, nessa medida, a incidência do impositivo direito penal do fato.
Diferente seria a conclusão se, por exemplo, estivesse o condutor do automóvel
dirigindo em velocidade muito acima do permitido, ou fazendo, propositalmente,
zigue-zague na pista, ou fazendo sucessivas ultrapassagens perigosas, ou
desrespeitando semáforos com sinal vermelho, postando seu veículo em rota de
colisão com os demais apenas para assustá-los, ou passando por outros
automóveis "tirando fino" e freando logo em seguida etc. Enfim,
situações que permitissem ao menos suscitar a possível presença de um estado
anímico compatível com o de quem anui com o resultado morte.
Assim,
não se afigura razoável atribuir a mesma reprovação a quem ingere uma dose de
bebida alcoólica e em seguida dirige em veículo automotor, comparativamente
àquele que, após embriagar-se completamente, conduz automóvel na via.
(STJ. 6ª Turma. REsp 1.689.173-SC,
Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 21/11/2017).
DESTAQUE:
A
embriaguez do agente condutor do automóvel, por si só, não pode servir de
premissa bastante para a afirmação do dolo eventual em acidente de trânsito com
resultado morte.